Saneamento ruim, gestão pior

O Brasil investe cada vez mais em saneamento. De um patamar de R$ 3 bilhões anuais no início dos anos 2000, hoje o governo destina ao setor uma média de R$ 8,4 bilhões por ano. 

A meta é investir mais R$ 35 bilhões até 2014. Porém, grande parte desses recursos pode acabar desperdiçada pela ineficiência do setor.



Faltam engenheiros capacitados nas prefeituras e empresas estatais para fazer os projetos, a maior parte dessas empresas opera no vermelho e o volume de água desperdiçada é imenso. A área de saneamento passou por uma recessão entre os anos 1980 e 1990, que gerou desmobilização da equipe técnica , diz o professor Léo Heller, da Universidade Federal de Minas Gerais. 

Quando o governo decidiu fazer as obras, foi preciso mobilizar uma porção de atores que não estavam estruturados. O setor não está preparado para receber esse investimento. Há uma inércia.

Da verba total do PAC 2 para saneamento, R$ 35 bilhões, só R$ 13 bilhões já foram contratados, por falta de projetos, ou pela assinatura de convênio com base em projetos que podem ser considerados apenas como esboços . O governo percebeu a deficiência e destinou R$ 600 milhões para que Estados e municípios consigam elaborar os pedidos. 

A Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa) tem 54 obras financiadas pela Caixa Econômica Federal (CEF) no valor de R$ 541 milhões, mas 22 delas estão paradas porque os projetos executivos apresentaram vários problemas, como ausência de sondagens do solo e estudos das interferências ambientais e urbanísticas.

Por causa da celeridade com que foram feitos, os trabalhos acabaram com algumas omissões e erros , afirma Alfredo Barros, diretor de Expansão e Tecnologia da empresa. A demanda supera a capacidade das empresas. Além disso, toda essa verba teve que ser financiada em nome do governo estadual porque a Cosanpa opera no vermelho e não pode se habilitar para fazer os empréstimos.

A maior parte das companhias estaduais de saneamento está na mesma situação. Das 26 empresas, 15 são deficitárias, ou seja, gastam mais do que arrecadam. O Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis), do Ministério das Cidades, indica que as operadoras de água e esgoto tiveram prejuízo de R$ 3 bilhões em 2009.

A Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (Caema) é uma das que luta para equilibrar as contas. Entre 2008 e 2010, contabilizou um prejuízo de R$ 96 milhões. Para se ter uma ideia do que isso representa, a empresa vai investir R$ 110 milhões para dobrar o índice de esgoto tratado em São Luís, construindo duas novas estações.

A nossa tarifa de água e esgoto é a menor do Brasil , diz o presidente da Caema, João Reis Moreira Lima. O custo de produção de um metro cúbico de água tratada é de R$ 3,36 , mas cobramos em média R$ 1,50. Como temos 30% de inadimplência, recebemos apenas R$ 1,05, quando deveria ser o triplo disso , afirma. A empresa já pediu à agência reguladora autorização para um reajuste de até 83%, mas enfrenta resistências da população. 

 O serviço já é ruim, e eles ainda querem aumentar a cobrança? , questiona a catadora Silvana Barros, membro do Conselho Estadual de Saneamento.

Grande parte das receitas também se perde em vazamentos e ligações clandestinas. Do total do volume de água tratada produzido no País, 37% se perde entre a estação de tratamento e a casa das pessoas. 

Ou seja, grande parte do trabalho de separar o lodo e adicionar cloro e flúor na água dos mananciais acaba indo pelo ralo. Isso acontece principalmente por causa das tubulações antigas que passaram muito tempo sem manutenção. 

No Recife, os testes da nova estação de tratamento do Pirapama, construída para acabar com o racionamento na cidade, provocaram o estouro de canos em vários pontos da cidade.

O problema de gestão no setor de saneamento é tão grande que deve consumir 20% dos 420 bilhões de investimentos a serem feitos nos próximos 20 anos. A ideia é investir R$ 86 bilhões apenas em programas de melhoria de eficiência e capacitação técnica de profissionais.

O diretor de Água e Esgoto da Secretaria de Saneamento do Ministério das Cidades, Johnny Fernandes, diz que é imprescindível que as empresas estatais melhorem sua performance. 

Não podemos trabalhar com um quadro em que há recurso, ele é disponibilizado, mas existem dificuldades de alocar a verba. Resolver isso é importantíssimo para continuarmos com um cenário de investimento a longo prazo , afirma.

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