A energia verde como um negócio




Por Jacqueline Batista Silva* - A maioria das considerações sobre a energia verde apresenta como motivador para a sua utilização a questão ambiental. Essa abordagem começa a ser substituída. 

Ao avaliar as possibilidades da economia verde na economia mundial em crise, é possível encontrar resultados interessantes.

Por muito tempo, temas como “economia verde” ou “utilização de fontes renováveis de energia em processos produtivos” fizeram parte de uma abordagem sobre mudança climática ou manutenção da qualidade da vida humana no futuro. Dizia respeito a alguma utilização consciente de recursos energéticos, mas sem a devida análise do fator econômico.


Para preencher essa lacuna a The Brookings Institution lançou em julho deste ano um relatório intitulado Sizing The Clean Economy, em que avalia do ponto de vista econômico – tomando como eixo a geração de empregos – o papel da economia verde nas regiões metropolitanas dos Estados Unidos.

O relatório – um dos mais claros e atualizados desse setor econômico – menciona uma grande dificuldade em mensurar todo o alcance dos empregos gerados pela economia verde, mas ainda assim, nenhum setor da economia americana tem sido mais celebrado como fonte de renovação econômica e geração de empregos.

O estudo abrange o período de 2003 a 2010 em todo o país, e seu detalhamento e categorização teriam como objetivo prover de informação econômica relevante às lideranças nacional, regional e estadual, a fim de que fatores que ainda retardam esse setor econômico possam ser mitigados ou eliminados.

Nosso objetivo aqui é transcrever os principais pontos do relatório e atentar para as recomendações que servem a todos os países dispostos a reconhecer o potencial da economia verde. As principais considerações sobre as regiões metropolitanas nos EUA são as seguintes:

* A economia limpa, nos EUA, emprega 2,7 milhões de trabalhadores.

O número parece pequeno, mas ele ganha maior proporção se considerarmos que isso é mais do que o número de empregos gerados pela energia fóssil e que consegue abarcar trabalhadores em todos os níveis de escolaridade/produção.

* Apesar de um crescimento comparativo menor no período do estudo (2003 – 2010), o setor teve um crescimento maior que o da economia em geral durante a recessão.

* A economia limpa é intensiva em produtos fabricados e exportação.

Avalia-se que 26% de toda a economia limpa gera empregos em manufatura, enquanto a economia como um todo geraria apenas 9% de empregos nessa área. Isso representa um potencial de utilização de mão-de-obra importante para abarcar uma camada específica da população. Outro ponto relevante apresentado é o de que os empregos relacionados à energia limpa exportam o dobro dos empregos tradicionais nos EUA.

* A economia limpa oferece mais oportunidades e melhor pagamento para trabalhadores com baixa e média educação formal do que a economia como um todo.

Os salários nos empregos de economia limpa são 13% maiores que os demais, quando observados os mesmos níveis de escolaridade.

* A economia limpa permeia todas as regiões metropolitanas, mas se manifesta em configurações variadas.

A economia limpa molda-se às características de cada região, de maneira que se apresenta mais desenvolvida ora no setor de serviços, ou industrial, no setor público ou de maneira mista. Assim, pode fazer parte de todos os planejamentos regionais, sem ter que descaracterizar a vocação econômica local.

* Fortes clusters industriais contribuem para um maior desenvolvimento da economia limpa.

No período observado, estabelecimentos integrantes de clusters industriais cresceram mais que os isolados: em média, 1,4 ponto percentual mais rapidamente.

Apesar dos dados positivos, as opiniões não são unânimes. O principal entrave à energia verde está no valor a ser dedicado à pesquisa e aos subsídios necessários ao desenvolvimento e implantação das novas tecnologias limpas para obtenção de energia num Estado em crise. Esses receios não estão presentes apenas na economia americana. Investir em momentos de crise sempre dividiu opiniões. Essa é mais uma contribuição do estudo. A adequada avaliação de um setor específico pode permitir ver um investimento como propulsor do desenvolvimento e, portanto, indispensável. O estudo apresenta uma análise do retorno que esse investimento tem trazido. Mostra a economia limpa como um negócio plausível dentro de uma ótica desenvolvimentista, e não apenas dentro de um aspecto ideológico-ambiental, alcançando também aqueles que consideram este um fator menos relevante.

Não podemos deixar de pensar em qual seria a condição brasileira da economia verde, e seu potencial nos planos de desenvolvimento apresentados por nossas lideranças nacionais e regionais. Um relatório similar que nos possibilitasse mensurar o alcance do setor no Brasil, dentro da posição de destaque mundial que passamos a ter, pode ser de extrema relevância para que a economia verde ganhe maior fatia de projetos e para que os investimentos na área ganhem maior prioridade.

O relatório apresenta também algumas recomendações, e elas não são prerrogativas do estado Americano. A primeira recomendação é a de fazer com que o Estado e as lideranças regionais promovam o uso de bens e serviços classificados como de baixo nível de emissão de carbono e ambientalmente orientados. Falamos aqui da taxação das emissões de carbono, da certificação de produtos ambientalmente responsáveis, e outras medidas que exigem uma atuação – e na verdade, intervenção – do Estado.

Outra recomendação é a criação de garantias de financiamento à ampliação dos segmentos industriais da economia limpa. A ampliação do capital voltado para o financiamento e consequente diminuição do risco para o investidor são fundamentais.

Um setor relevante a considerar é o de pesquisa e desenvolvimento – a ser valorizado nos níveis nacional e regional. Inovação é matéria-prima da economia verde: abrange não apenas a criação de novas tecnologias, mas também o aprimoramento daquelas que utilizarão algo que já é considerado, por si só, um novo recurso: a eficiência energética.

As recomendações e desafios apresentados no estudo podem ser vistos em nível global. Não são características tipicamente americanas. É bastante razoável que, diante de dificuldades orçamentárias, o setor de investimentos não receba a devida atenção. Talvez seja essa a maior importância de uma avaliação séria das implicações do crescimento da economia verde. Podemos, assim como os EUA, estar perdendo uma fatia importante do mercado global. Podemos, também, estar refreando o nosso próprio crescimento por considerar um gasto postergável o que seria um investimento de alto retorno.

Enfrentamos duas grandes necessidades: a de valorar de maneira séria o alcance da economia verde, e a de mudar a concepção de que essa seria apenas uma fonte periférica de desenvolvimento. Um passo importante foi dado e ele reverbera globalmente. Cabe a nós atentar para a necessidade de não ficar para trás nessa caminhada e definir, desde agora, o papel que iremos desempenhar.

* Jacqueline Batista Silva é bacharel em Física pela Universidade Federal Fluminense (UFF), com MBA em Economia e Gestão em Energia pelo Instituto COPPEAD de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração. É pesquisadora do Grupo de Economia da Energia da UFRJ desde 2010

(Nota da Redação: artigo publicado no Infopetro, blog do Grupo de Economia da Energia do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (GEE/UFRJ).