Agência Alagoas
Empreendedor transforma resíduos da construção civil em negócio rentável
Sustentabilidade é a palavra de ordem para o novo mercado. Montar um negócio baseado em práticas sustentáveis é, atualmente, uma realidade adotada por pequenos, médios e grandes empreendedores.
Segundo Pesquisa Nacional sobre Responsabilidade Social e Práticas Sustentáveis, divulgada em 2011 pelo Instituto ADVB de Responsabilidade Socioambiental, o investimento médio das empresas em sustentabilidade está na casa de R$ 1,2 milhão ao ano.
Mas, ao contrário do que parece, nem sempre é preciso investir muito para obter bons resultados.
Em Alagoas, um ex-garçom provou que com pouco dinheiro também é possível obter lucro e cuidar do meio ambiente. Com apenas R$ 10 no bolso, mas com muita criatividade na cabeça, Gerônimo Manoel de Oliveira, 37 anos, transformou o lixo da construção civil em fonte de renda.
“Um dia eu fiz um exame que acusou um problema sério no estômago e isso me deixou em cima de uma cama. Numa quinta-feira, ouvi uma voz que dizia que eu me levantasse, comprasse um cano e fizesse uma luminária.
Nesse dia eu tinha dez reais no bolso. Com esse dinheiro eu comprei onze quilos de cano e fiz cinco luminárias, que me renderam um total de R$ 550”, relembra.
Com o aperfeiçoamento do trabalho e com várias ideias em mente, o empreendedor criou um projeto que tem rendido bons frutos e consiste em reaproveitar os restos de cano de PVC que não serviriam mais para uso nos canteiros de obras de grandes construtoras.
Batizado de “Resíduos de PVC salvando a natureza”, o projeto, além de gerar emprego e renda, também colabora com o meio ambiente, evitando que os resíduos sólidos sejam descartados.
“Apostei na minha ideia de trabalhar com o PVC, larguei meu emprego fixo e passei por maus bocados, mas deu certo. Meu sonho agora é trabalhar exclusivamente com o PVC reaproveitado dos canteiros de obras.
Quero fazer com que as construtoras enxerguem que cada pedaço de cano que seria jogado fora pode significar um emprego para um pai de família”, conta Gerônimo Oliveira, que atualmente emprega três funcionários.
A parceria com a GR Artes em PVC – empresa de Gerônimo – também traz benefícios para as construtoras, que acabam adquirindo produtos como placas de sinalização e até chaveiros, que são entregues aos clientes após a finalização das obras, a um preço bem abaixo do mercado.
E com o diferencial de ser um produto que terá ainda mais durabilidade.
A primeira construtora a apostar na ideia do pequeno empreendedor foi a Engenharq. Presente no mercado alagoano há 12 anos, a empresa se preocupa com o meio social que interage.
Segundo a assessora de Qualidade da construtora, Kalyne Gonçalves, a parceria foi uma iniciativa de Gerônimo e nasceu a partir da construção do Residencial Novo Jardim, localizado no bairro do Eustáquio Gomes.
“A Engenharq sempre adotou políticas de responsabilidade ambiental nos empreendimentos construídos. Em relação aos resíduos de PVC, por exemplo, ele já era reaproveitado, mas de maneira artesanal dentro da própria obra.
O trabalho realizado por Gerônimo é diferenciado”, explica.
Além de obter peças com design e acabamento de qualidade, por meio da parceria, a construtora conseguiu diminuir custos, encurtar prazos e reduzir o acúmulo de resíduo na obra, um equilíbrio perfeito entre três importantes pilares: ambiental, econômico e social.
Produção
Outro diferencial da empresa montada por Gerônimo está no maquinário utilizado durante o processo de confecção das peças. Nenhuma delas permanece com o aspecto original ou têm a mesma utilidade dada pelo fabricante.
Todas foram modificadas e adaptadas pelo próprio artesão para que pudessem ser utilizadas na transformação dos canos de PVC. No total, são oito equipamentos inéditos, únicos, que funcionam como o coração da oficina. Um deles, por exemplo, serve para transformar os pedaços de cano em placas de PVC que vão dar vida a novos objetos.
“Não existe uma máquina no mercado que transforme cano de PVC em uma placa, por exemplo, e por isso eu preciso fazer as modificações no maquinário, adequando ele para as minhas necessidades”, conta Gerônimo.
As peças confeccionadas na oficina que fica em um terreno ao lado da casa em que mora, na parte alta de Maceió, possuem detalhes que impressionam. As luminárias, em especial, trazem um acabamento que remete às rendas alagoanas, garantindo um efeito de sofisticação aos ambientes em que são utilizadas.
Há também bandejas, pratos, galheteiros, chaveiros, lixa para pés, gaiolas e até carteiras escolares. Somente patenteados são cerca de 140 produtos inovadores.
Da primeira luminária até hoje, muitas foram as ideias colocadas em prática pelo empreendedor que se orgulha de ser chamado de artesão. Uma delas resultou na confecção de carteiras escolares cerca de 25 vezes mais resistentes que as utilizadas nas unidades educacionais atualmente.
De acordo com Gerônimo, as carteiras feitas de canos de PVC já foram adquiridas por algumas escolas particulares de Alagoas. “Além de ajudar o meio ambiente, essas escolas também saem na vantagem por estarem utilizando um material altamente resistente”, destaca.
Muitos objetos confeccionados por Gerônimo já passaram por avaliações de consultores do Sebrae, que se surpreenderam com a qualidade e o acabamento dos produtos. Para se ter uma ideia, uma luminária da GR Artes feita com cano de PVC chegou a ser avaliada em R$ 3 mil.
Com tantas qualidades, os produtos estão ganhando, aos poucos, o mercado alagoano. De acordo com Gerônimo, cerca de 90% dos restaurantes de Maceió já fazem uso dos produtos da GR Artes em PVC.
São galheteiros, bandejas e outros vários utilitários que, além de terem uma durabilidade maior que outros produtos, também são de fácil limpeza e atendem às exigências da Vigilância Sanitária.
PVC
O Policloreto de Vinila, conhecido como PVC, é um material muito utilizado na construção civil, especialmente nas tubulações de água. Entre todos os plásticos, ele é o único que não é produzido exclusivamente por petróleo, e sim por uma mistura de cloreto de sódio com eteno.
O descarte inadequado do plástico é altamente prejudicial ao meio ambiente e representa também um grave problema de saúde pública.
Em Alagoas, o único município que possui aterro sanitário é Maceió. Nas demais cidades, os resíduos de PVC provenientes da construção terminam indo parar nos lixões. Nestes locais, o lançamento do resíduo é feito no solo, acarretando em sérios problemas.
O Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil mostra que, em Alagoas, 58,3% dos resíduos sólidos foram descartados nos lixões no ano de 2011. Esta porcentagem é o equivalente a 1.301 toneladas por dia de resíduo sólido jogado a céu aberto.
Enquanto isso, no mesmo período, apenas 77 t/dia foram destinadas ao aterro.
“Os resíduos de PVC são prejudiciais também ao aterro, pois diminuem seu tempo de vida útil”, esclarece o técnico da empresa de consultoria Teia Serviços Ambientais, Gleriston Oliveira.
Atualmente, a maneira encontrada para amenizar o problema do descarte de resíduos em todo o Brasil é transformar o lixo plástico em matéria-prima, ou descobrir soluções simples, criativas e viáveis, assim como fez o ex-garçom alagoano Gerônimo.