Sei que falta liderança sustentável numa empresa, por exemplo, quando um diretor afirma a uma analista, com ar sério: “Para com esse negócio de sustentabilidade e vamos trabalhar um pouquinho, né?”
Quando o vice-presidente me diz, sem constrangimento, que sustentabilidade é importante, mas as medidas para garanti-la na gestão do negócio podem ficar para o ano que vem, pois a empresa não se encontra preparada para as mudanças necessárias.
É certamente o que ele vai dizer no “ano que vem”, simplesmente porque não quer aceitar as responsabilidades – e os custos – da transição para um modelo mais sustentável de negócio.
Quando o presidente diz, sem receio de parecer arrogante, que sustentabilidade está no DNA da empresa desde que ela nasceu e que, portanto, ela não precisa fazer mais nada para ser sustentável.
Esta é uma das frases que mais me provocam comichão. Pelo que tem de prepotente e ingênua ao mesmo tempo. Estrutura-se na falsa ideia de que um tema contemporâneo –como é a sustentabilidade, valor deste século 21 – já venha sendo praticado pela empresa há 50, 80 ou 100 anos.
Quando quem deveria tomar a decisão de mudança, transfere a responsabilidade a alguém em posição hierárquica inferior, normalmente a menina ou menino “da responsabilidade social”, um profissional júnior lotado num departamento meramente funcional, sem qualquer poder, que só vê o presidente uma vez ao ano, na festa de encerramento das atividades do ano.
A diferença entre sustentabilidade para valer e sustentabilidade para constar está em quanto o tema encontra-se mais próximo de quem toma decisões. Com os anos de experiência, aprendi a identificar o estágio de sustentabilidade a partir do meu primeiro interlocutor. Mais próximo do poder, mais avançado. Mais longe, menos avançado.
Sei que falta liderança sustentável numa empresa quando o presidente cria um comitê de sustentabilidade e não aparece nem na primeira reunião para deixar claras suas crenças e expectativas. Este tipo de atitude, muito comum, revela dois problemas:
(1)sustentabilidade não é um tema suficientemente importante para que eu, líder, invista meu tempo nele;
(2) enquanto não tenho tempo para pensar em sustentabilidade, crio uma instância interna para fazer de conta que estamos preocupados com o tema.
Uma pena. Comitês de sustentabilidade, quando bem liderados, podem ser extremamente úteis e efetivos. E existem os que são, felizmente.
Quando o presidente da empresa convence o marketing de que está na hora de botar sustentabilidade na imagem, mas se esquece de convencer os colaboradores de que ela deve estar na cultura?
Lição aprendida nos últimos anos: primeiro a lição de casa, depois a comunicação. E a comunicação dever ser feita, antes de tudo, para os funcionários, colaboradores e parceiros.
Se a empresa não consegue convencer os mais próximos de que se preocupa com a sustentabilidade, como espera persuadir os consumidores e a sociedade? As corporações que pularam essa lição, ainda hoje amargam arrependimentos.
Quando mesmo depois de ser apresentado, com detalhes, ao conceito de diversidade, o presidente continua achando que isso não tem nada a ver com a “lógica” da empresa! Este mesmo dirigente é o que precisa da “cola” de um assessor de imprensa para falar de sustentabilidade em uma entrevista para uma revista de negócio.
O mesmo que diz em público que sustentabilidade está na “estratégia do negócio”, e no privado, reclama com os mais próximos que ela representa só custo e desvio de foco.
O mesmíssimo que, diante de uma crise que aponta trabalho escravo na cadeia de valor de sua empresa, afirma não ter responsabilidade nenhuma pelo que acontece com empresas terceirizadas!
Sei que falta liderança sustentável numa empresa quando pergunto a um diretor se a empresa tem uma política de sustentabilidade integrada à estratégia de negócio e ele diz que sim, mas só fala de projetos pontuais, localizados, periféricos e… completamente descolados da estratégia de negócio na empresa.
Quando existe um discurso pródigo sobre inovação em sustentabilidade e, na prática, nenhum ambiente favorável que valorize as contribuições vindas das bordas, isto é, dos colaboradores, fornecedores, clientes e comunidades.
Quando sai um presidente e o seu substituto decide pisar no freio das iniciativas de sustentabilidade, colocando no freezer ações que vinham ajudando a criar uma cultura para o tema na corporação.
Ah, é claro, ao tomar tais medidas, ele se apoia em argumentos velhos conhecidos de guerra, como “reduzir custos”, “resgatar o foco” e “concentrar energia no essencial.” Business as usual total, mas com um verniz verdinho!
Quando a alta direção decide concentrar o pensamento estratégico da sustentabilidade (isso mesmo, mas sem essas palavras, claro!) no marketing, abrindo mão de construir ações de transformação “da porta para dentro” em detrimento de um bom discurso “da porta para fora”!!!
Quando o principal dirigente diz – entre os mais próximos, claro – que sustentabilidade “custa caro” e que só vai investir em produtos sustentáveis quando o consumidor estiver disposto a “pagar o preço” ou quando o governo oferecer algum tipo de “incentivo”…
Quando o diretor de sustentabilidade apresenta, em público, com orgulho, a política de diversidade da empresa e, no privado (numa impressionante demonstração de falta de coerência entre o pensar e o agir), destila fel e preconceito contra mulheres, negros e homossexuais.
Quando a moça da responsabilidade socioambiental me sabatina antes de começar uma reunião com o presidente da empresa para me alertar sobre o que ele “gosta ou não gosta” de ouvir sobre sustentabilidade… e ainda me pede para que eu seja breve, não passe de 15 minutos, já ele não tem muita paciência para assuntos que não sejam “do negócio”.
Juro, amigos, vivi e vivo essas situações todos os dias. Espero que, ao dividi-las com vocês, entendam porque decidi trabalhar com liderança sustentável. Afinal, sabemos o que significa trabalhar numa empresa sem líderes com valores.
E não me consta que estejamos felizes com isso.