Por Emanuel Alencar (emanuel.alencar@oglobo.com.br) | Agência O Globo
RIO - O Rio acerta os ponteiros para voltar a ser o centro do mundo nas discussões sobre sustentabilidade.
A 114 dias do início da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável - a Rio+20, numa alusão às duas décadas da Rio-92 -, a cidade quer aproveitar a presença de até 150 chefes de Estado para promover uma festa democrática, ligando o asfalto às favelas, diferentes regiões da cidade e a capital aos municípios vizinhos.
A projeção do setor hoteleiro é animadora: 94% dos leitos do Rio já estão ocupados para junho, e a expectativa é que mais da metade dos congressistas tenha que se hospedar em cidades vizinhas, como Mangaratiba, Petrópolis, Niterói e Maricá.
De 13 a 22 de junho, a cidade deve receber 50 mil pessoas cadastradas pela ONU e outras milhares interessadas em discutir os rumos do planeta. Como num treino para a Copa e as Olimpíadas, a prefeitura se programa para deixar boa impressão. E anuncia o "Viradão sustentável", com atrações musicais pipocando em vários bairros, e o "Green nation fest", miscelânea cultural na Quinta da Boa Vista. Haverá ainda uma cúpula do C-40, o grupo que reúne os prefeitos das maiores cidade do mundo, no Forte de Copacabana.
Déficit de quartos na capital preocupa
A descentralização das discussões será uma marca do evento. Embora a reunião da ONU esteja agendada para o Riocentro, em Jacarepaguá, as ONGs e a sociedade civil prometem fazer barulho no Aterro do Flamengo e na região do Porto.
O prefeito Eduardo Paes diz que, durante o encontro, a cidade não vai vender ao mundo a imagem de metrópole sustentável, mas de um centro que está no rumo certo para resolver antigos passivos ambientais:
- Estamos encarando a Rio+20 como um teste para a Copa e as Olimpíadas, sim. Até junho, vamos fechar o Aterro de Gramacho e tirar do papel o primeiro BRT (o Transoeste), as obras de saneamento da Zona Oeste, e o Morar Carioca sustentável dos morros da Babilônia e Chapéu Mangueira. É claro que a questão hoteleira preocupa. São poucas as cidades do mundo que têm uma capacidade de hospedagem gigantesca. Mas tudo está sendo alinhavado com o Itamaraty. A cidade vai estar bem mais preparada do que estava em 1992.
Questões de logística e financeiras foram determinantes para a escolha do Riocentro como sede das discussões, afirma o prefeito:
- No Cais do Porto (onde inicialmente seria realizado o encontro), seria muito transtorno, por causa das obras. E, para garantir a segurança dos chefes de Estado, teríamos que fechar a Perimetral.
Outro aspecto curioso que influenciou na escolha do Riocentro foi a necessidade de um ambiente livre de pilastras: nenhuma delegação pode ter uma visão dos palestrantes mais privilegiada que a outra. E o Riocentro, preparado para conferências, oferece boa perspectiva em todos os seus ângulos.
Quanto aos transtornos no trânsito, Paes diz que eles serão inevitáveis:
- Vamos ter algum transtorno. Mas o Rock in Rio não foi o caos que todos imaginavam.
Presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação, Alexandre Sampaio ressalta que a Rio+20 encontra a cidade num momento de recuperação econômica. Como os turistas têm ficado mais tempo no Rio, a cidade disponibilizaria apenas metade de seus leitos (cerca de 22 mil) às delegações da conferência:
- Desde o início das conversas com o Itamaraty, ficou claro que a cidade terá de contar com a ajuda dos vizinhos. Niterói, que tem dez mil quartos, e cidades como Petrópolis e Teresópolis vão se beneficiar.
- Existe déficit de apartamentos na capital - emenda Pedro de Lamare, presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SinRio). - A conferência pega a cidade num momento de recuperação. A violência estava afetando o turismo da cidade. Isso foi revertido.
Entre as iniciativas que a cidade vai apresentar ao mundo na conferência está o programa Rio Cidade Sustentável. O projeto piloto vem sendo desenvolvido no Morro da Babilônia, no Leme, sob a coordenação do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimentos Sustentável (CEBDS), entidade civil que reúne 70 empresas. A faxineira Reina Maria da Silva, de 56 anos, é uma das 160 pessoas que estão fazendo curso de capacitação para melhorias habitacionais. Duas vezes por semana, ela tem aulas de noções de engenharia civil, elétrica e hidráulica.
Reina mora numa pequena casa de quarto e sala com três netos. Mas, como não podem usar o quarto - sob ameaça de desabamento -, todos dormem apertados no sofá da sala.
- Quero aproveitar as aulas para reformar minha casa. Depois, pretendo colocar uma caixa d'água para captar água da chuva. Quero participar do projeto de horta comunitária. Eu me ligo bastante em sustentabilidade - diz Reina.
A faxineira não sabe, mas seu exemplo será ao mostrado aos chefes de Estado como um exemplo de economia sustentável já em curso no Rio. Mais complicado, entretanto, será associar a imagem do morro do Leme à de uma comunidade carente. Em meados do ano passado, o economista Sérgio Besserman Vianna, presidente do grupo de trabalho da prefeitura para a Rio+20, mostrou a comunidade ao secretário-geral da conferência, Sha Zukang. O diplomata chinês ficou impressionado - e bravo: "This is not a slum!" ("Isto não é uma favela"), afirmou ele. Besserman sustentou que era, sim, uma favela carioca.
- Para Zukang, era um bairro de classe média da Índia. Uma coisa é Babilônia, Chapéu Mangueira, outra coisa é Manguinhos. De fato, essa identidade entre favela e pobreza não faz sentido. Dois terços da pobreza do Rio não estão em favela. Vamos mostrar essa heterogeneidade, marca carioca, na conferência - ressalta Besserman. - Não vamos esconder os tamanhos de nossos desafios em saneamento e na necessidade de despoluição de nossas lagoas.
Segurança terá mais de R$ 200 milhões
Metade do orçamento geral para o encontro - são previstos R$ 430 milhões do governo federal - vai para segurança, cuja responsabilidade ficará com o Comando Militar do Leste. Apesar da pacificação de 19 favelas, trata-se de uma medida preventiva, para garantir o ir e vir das delegações. O secretário municipal de Conservação, Carlos Roberto Osório, diz que a logística será um grande desafio:
- Não é um evento comum. A maioria dos chefes de Estado ficarão em Copacabana, Ipanema e Leblon ,e terá que se deslocar para Jacarepaguá. Muitos usarão helicópteros. A Rio+20 vai nos exigir enorme complexidade operacional.
A baixa adesão dos chefes de Estado à conferência é uma preocupação das autoridades brasileiras. Dois temas centrais serão discutidos na Rio+20: economia verde/redução da pobreza e governança global ambiental. O presidente do Instituto Brasil Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), Haroldo Mattos de Lemos, teme que a falta de um documento estabelecendo metas para os países esvazie o encontro:
- Na Rio-92, o conceito de desenvolvimento sustentável foi discutido e aprovado. Dessa vez, a falta de um plano com metas concretas para atingir a sustentabilidade põe em xeque o encontro. Há 20 anos, vieram 112 chefes de Estado. Apesar dos esforços do governo brasileiro, desta vez a crise global deve minar a adesão dos líderes.
O diretor do Greenpeace Brasil, Marcelo Furtado, critica a concentração das manifestações da sociedade civil no Aterro do Flamengo, a 37 quilômetros do Riocentro:
- Essa distância explicita o que está acontecendo no mundo: governos conversam entre eles e a sociedade dialoga sozinha. Vamos mobilizar a população e defender um Brasil que invista em energias renováveis e não no pré-sal. Não vamos deixar a turma do Riocentro falar para si mesma.
Durante a conferência, a ONG apresentará ao público, no Aterro, o Rainbow Warrior 3, seu novo navio de ativismo ambiental.
De 13 a 22 de junho, a cidade deve receber 50 mil pessoas cadastradas pela ONU e outras milhares interessadas em discutir os rumos do planeta. Como num treino para a Copa e as Olimpíadas, a prefeitura se programa para deixar boa impressão. E anuncia o "Viradão sustentável", com atrações musicais pipocando em vários bairros, e o "Green nation fest", miscelânea cultural na Quinta da Boa Vista. Haverá ainda uma cúpula do C-40, o grupo que reúne os prefeitos das maiores cidade do mundo, no Forte de Copacabana.
Déficit de quartos na capital preocupa
A descentralização das discussões será uma marca do evento. Embora a reunião da ONU esteja agendada para o Riocentro, em Jacarepaguá, as ONGs e a sociedade civil prometem fazer barulho no Aterro do Flamengo e na região do Porto.
O prefeito Eduardo Paes diz que, durante o encontro, a cidade não vai vender ao mundo a imagem de metrópole sustentável, mas de um centro que está no rumo certo para resolver antigos passivos ambientais:
- Estamos encarando a Rio+20 como um teste para a Copa e as Olimpíadas, sim. Até junho, vamos fechar o Aterro de Gramacho e tirar do papel o primeiro BRT (o Transoeste), as obras de saneamento da Zona Oeste, e o Morar Carioca sustentável dos morros da Babilônia e Chapéu Mangueira. É claro que a questão hoteleira preocupa. São poucas as cidades do mundo que têm uma capacidade de hospedagem gigantesca. Mas tudo está sendo alinhavado com o Itamaraty. A cidade vai estar bem mais preparada do que estava em 1992.
Questões de logística e financeiras foram determinantes para a escolha do Riocentro como sede das discussões, afirma o prefeito:
- No Cais do Porto (onde inicialmente seria realizado o encontro), seria muito transtorno, por causa das obras. E, para garantir a segurança dos chefes de Estado, teríamos que fechar a Perimetral.
Outro aspecto curioso que influenciou na escolha do Riocentro foi a necessidade de um ambiente livre de pilastras: nenhuma delegação pode ter uma visão dos palestrantes mais privilegiada que a outra. E o Riocentro, preparado para conferências, oferece boa perspectiva em todos os seus ângulos.
Quanto aos transtornos no trânsito, Paes diz que eles serão inevitáveis:
- Vamos ter algum transtorno. Mas o Rock in Rio não foi o caos que todos imaginavam.
Presidente da Federação Brasileira de Hospedagem e Alimentação, Alexandre Sampaio ressalta que a Rio+20 encontra a cidade num momento de recuperação econômica. Como os turistas têm ficado mais tempo no Rio, a cidade disponibilizaria apenas metade de seus leitos (cerca de 22 mil) às delegações da conferência:
- Desde o início das conversas com o Itamaraty, ficou claro que a cidade terá de contar com a ajuda dos vizinhos. Niterói, que tem dez mil quartos, e cidades como Petrópolis e Teresópolis vão se beneficiar.
- Existe déficit de apartamentos na capital - emenda Pedro de Lamare, presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SinRio). - A conferência pega a cidade num momento de recuperação. A violência estava afetando o turismo da cidade. Isso foi revertido.
Entre as iniciativas que a cidade vai apresentar ao mundo na conferência está o programa Rio Cidade Sustentável. O projeto piloto vem sendo desenvolvido no Morro da Babilônia, no Leme, sob a coordenação do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimentos Sustentável (CEBDS), entidade civil que reúne 70 empresas. A faxineira Reina Maria da Silva, de 56 anos, é uma das 160 pessoas que estão fazendo curso de capacitação para melhorias habitacionais. Duas vezes por semana, ela tem aulas de noções de engenharia civil, elétrica e hidráulica.
Reina mora numa pequena casa de quarto e sala com três netos. Mas, como não podem usar o quarto - sob ameaça de desabamento -, todos dormem apertados no sofá da sala.
- Quero aproveitar as aulas para reformar minha casa. Depois, pretendo colocar uma caixa d'água para captar água da chuva. Quero participar do projeto de horta comunitária. Eu me ligo bastante em sustentabilidade - diz Reina.
A faxineira não sabe, mas seu exemplo será ao mostrado aos chefes de Estado como um exemplo de economia sustentável já em curso no Rio. Mais complicado, entretanto, será associar a imagem do morro do Leme à de uma comunidade carente. Em meados do ano passado, o economista Sérgio Besserman Vianna, presidente do grupo de trabalho da prefeitura para a Rio+20, mostrou a comunidade ao secretário-geral da conferência, Sha Zukang. O diplomata chinês ficou impressionado - e bravo: "This is not a slum!" ("Isto não é uma favela"), afirmou ele. Besserman sustentou que era, sim, uma favela carioca.
- Para Zukang, era um bairro de classe média da Índia. Uma coisa é Babilônia, Chapéu Mangueira, outra coisa é Manguinhos. De fato, essa identidade entre favela e pobreza não faz sentido. Dois terços da pobreza do Rio não estão em favela. Vamos mostrar essa heterogeneidade, marca carioca, na conferência - ressalta Besserman. - Não vamos esconder os tamanhos de nossos desafios em saneamento e na necessidade de despoluição de nossas lagoas.
Segurança terá mais de R$ 200 milhões
Metade do orçamento geral para o encontro - são previstos R$ 430 milhões do governo federal - vai para segurança, cuja responsabilidade ficará com o Comando Militar do Leste. Apesar da pacificação de 19 favelas, trata-se de uma medida preventiva, para garantir o ir e vir das delegações. O secretário municipal de Conservação, Carlos Roberto Osório, diz que a logística será um grande desafio:
- Não é um evento comum. A maioria dos chefes de Estado ficarão em Copacabana, Ipanema e Leblon ,e terá que se deslocar para Jacarepaguá. Muitos usarão helicópteros. A Rio+20 vai nos exigir enorme complexidade operacional.
A baixa adesão dos chefes de Estado à conferência é uma preocupação das autoridades brasileiras. Dois temas centrais serão discutidos na Rio+20: economia verde/redução da pobreza e governança global ambiental. O presidente do Instituto Brasil Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), Haroldo Mattos de Lemos, teme que a falta de um documento estabelecendo metas para os países esvazie o encontro:
- Na Rio-92, o conceito de desenvolvimento sustentável foi discutido e aprovado. Dessa vez, a falta de um plano com metas concretas para atingir a sustentabilidade põe em xeque o encontro. Há 20 anos, vieram 112 chefes de Estado. Apesar dos esforços do governo brasileiro, desta vez a crise global deve minar a adesão dos líderes.
O diretor do Greenpeace Brasil, Marcelo Furtado, critica a concentração das manifestações da sociedade civil no Aterro do Flamengo, a 37 quilômetros do Riocentro:
- Essa distância explicita o que está acontecendo no mundo: governos conversam entre eles e a sociedade dialoga sozinha. Vamos mobilizar a população e defender um Brasil que invista em energias renováveis e não no pré-sal. Não vamos deixar a turma do Riocentro falar para si mesma.
Durante a conferência, a ONG apresentará ao público, no Aterro, o Rainbow Warrior 3, seu novo navio de ativismo ambiental.